Riscos da Cirurgia de Tireoide: Protegendo o Nervo da Voz e o Metabolismo do Cálcio

Cirurgião de cabeça e pescoço realizando tireoidectomia com preservação do nervo da voz e das glândulas paratireoides.

A decisão de se submeter à cirurgia de tireoide (tireoidectomia) é sempre acompanhada pela natural preocupação com os riscos e o processo de recuperação. É meu dever, como especialista, trazer clareza e tranquilidade, explicando detalhadamente quais são esses riscos e, mais importante, como a técnica cirúrgica moderna atua para minimizá-los.


Eu sou o Dr. Erivelto Volpi, cirurgião de cabeça e pescoço dedicado às doenças da tireoide e paratireoide. Na minha experiência, praticamente 100% dos pacientes que vêm para a remoção da tireoide perguntam sobre os riscos. Além dos riscos gerais de qualquer cirurgia (infecção e hemorragia, que, graças a Deus, são extremamente baixos na tireoidectomia), há dois grandes riscos específicos que envolvem as estruturas vizinhas à glândula: o nervo da voz e as glândulas paratireoides.


Este guia detalhado irá desmistificar esses riscos, focando na anatomia, na técnica de preservação e no que esperar no pós-operatório.

Onde a Tireoide se Encontra com a Voz

Para entender o risco de rouquidão, precisamos recordar a localização da tireoide:

  • Tireoide e Traqueia: A glândula fica na região anterior do pescoço, aderida à traqueia (o tubo que leva ar aos pulmões), logo abaixo da cartilagem da laringe (o pomo de Adão).
  • As Cordas Vocais: Dentro da laringe, ficam as cordas vocais — pequenas dobras de tecido que vibram para produzir o som.


O Risco da Voz: O Nervo Laríngeo Recorrente

O ponto crucial, e que dita o risco de rouquidão, não são as cordas vocais em si, mas sim os nervos que as controlam.

  • O Trajeto: Os nervos laríngeos recorrentes (um de cada lado, direito e esquerdo) chegam à laringe de baixo para cima, passando por trás da tireoide, muitas vezes grudadinhos na glândula. Eles são finos e delicados.
  • O Protocolo de Preservação (Dissecção): Antes de sequer pensarmos em remover a tireoide, o cirurgião experiente precisa atuar com extrema delicadeza. Nós temos que encontrar o nervo da voz, isolá-lo e separá-lo da tireoide — um processo que chamamos de dissecção do nervo. Esse é um passo obrigatório para garantir a segurança da voz.

Complicações da Voz: De Rouquidão Temporária a Definitiva

Graças às modernas técnicas operatórias e à tecnologia embarcada, a imensa maioria das cirurgias é realizada sem nenhum problema na voz. No entanto, é nosso dever informar sobre as possibilidades:

1. Neuropraxia (Rouquidão Transitória)

Este é o evento adverso mais comum relacionado à voz.


  • O Que É: Ocorre quando o nervo é "mexido" durante o processo de dissecção e isolamento. Mesmo com todo o cuidado, essa manipulação pode causar uma inflamação temporária do nervo (neuropraxia).
  • Efeito: O nervo inflamado não consegue transmitir o impulso elétrico corretamente, e a corda vocal fica paralisada ou com função reduzida. Isso leva à rouquidão.
  • Recuperação: Na vasta maioria dos casos, essa rouquidão é transitória. A inflamação regride espontaneamente. A recuperação do nervo e, consequentemente, da voz, pode levar de 8 a 12 semanas, em média, mas é geralmente completa.
  • Tratamento: Se a inflamação for mais intensa, o paciente pode precisar de Fonoterapia (fisioterapia da voz). Da mesma forma que um paciente opera o joelho e faz fisioterapia para recuperar o movimento, a Fonoterapia ajuda a reabilitar a função da corda vocal durante o período de recuperação do nervo.



2. Lesão Permanente (Rouquidão Definitiva)

Em situações mais raras e graves, como tumores muito grandes que invadem o nervo ou cirurgias complexas de repetição, pode haver uma lesão que não se reverte. O risco de lesão definitiva é muito baixo, mas deve ser discutido. A experiência do cirurgião e o uso de monitoramento intraoperatório são as melhores defesas contra essa complicação.

O Segundo Grande Risco: As Glândulas Paratireoides e o Cálcio

O segundo grande risco específico da tireoidectomia envolve as glândulas paratireoides.

Apenas para recordar:

  • Anatomia: São quatro glândulas minúsculas (de 6 a $8 \text{ mm}$ cada) localizadas na parte de trás da tireoide.
  • Função: Produzem o Hormônio Paratireoidiano (PTH), o maestro que regula os níveis de cálcio no sangue.

O Risco de Hipocalcemia (Baixo Nível de Cálcio)

Durante a cirurgia, a manipulação ou o comprometimento dos vasos sanguíneos que irrigam essas glândulas podem fazer com que elas parem de funcionar temporariamente (hipoparatireoidismo transitório).

  • Consequência: A falta de PTH leva à queda do nível de cálcio no sangue (hipocalcemia).
  • Sintomas: Os sintomas de hipocalcemia incluem formigamento ou dormência nos lábios, mãos e pés, e, em casos mais severos, câimbras e espasmos musculares.

A Estratégia de Preservação e Recuperação

Minha prioridade é sempre identificar, isolar e preservar as quatro paratireoides.

  • Autotransplante: Se uma glândula for removida acidentalmente ou se o suprimento de sangue for comprometido, nós a retransplantamos em um músculo do pescoço ou do braço do paciente para que ela retome sua função hormonal.
  • Suplementação: No pós-operatório, a necessidade de suplementação oral de cálcio e vitamina D é comum, mesmo nos casos de preservação total. Isso é feito para dar tempo para que as paratireoides "machucadas" pela manipulação se recuperem.
  • Monitoramento: Fazemos um acompanhamento rigoroso dos níveis de cálcio e PTH nas primeiras horas e dias. Na maioria dos casos, o uso de cálcio é transitório, durando algumas semanas ou meses até que as paratireoides voltem a funcionar plenamente. O hipoparatireoidismo permanente é raro, mas exige suplementação contínua e acompanhamento.

O Papel da Tecnologia e da Experiência

A redução desses riscos está diretamente ligada à experiência do cirurgião e à incorporação de tecnologias que aumentam a segurança:



  • Monitoramento Intraoperatório de Nervos (IONM): O uso de IONM permite que o cirurgião teste a função do nervo da voz antes e depois da dissecção, fornecendo um feedback em tempo real que ajuda a proteger o nervo.
  • Técnicas de Imagem de Paratireoide: O uso de auto-fluorescência ou outros corantes permite a identificação mais precisa das paratireoides, garantindo que elas sejam deixadas no local ou autotransplantadas com sucesso.
  • Volume Cirúrgico: Estudos científicos demonstram que cirurgiões que realizam um alto volume de tireoidectomias anualmente apresentam taxas significativamente mais baixas de complicações de nervo e paratireoide.


Converse sempre com o seu médico sobre a experiência dele com a cirurgia de tireoide e as técnicas de segurança que ele utiliza.


Um grande abraço e conte com o cuidado de um especialista para uma cirurgia segura e um pós-operatório tranquilo.


Aviso Legal: Este artigo foi escrito com o objetivo de educar e informar, apresentando a visão de um especialista na área. As informações contidas aqui são baseadas em diretrizes médicas e na experiência clínica do Dr. Erivelto Volpi, mas não substituem em hipótese alguma a consulta médica presencial ou a avaliação especializada. A sua conduta de tratamento deve ser definida individualmente, após a análise completa do seu histórico, exame físico e exames complementares.

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