Cirurgia de Paratireoide: Quando é Indicada, Como Detectar e a Importância da Dosagem de PTH Intraoperatório

O metabolismo do cálcio é um pilar silencioso da nossa saúde, essencial para a força dos ossos, o ritmo cardíaco e a função nervosa. E o maestro que rege esse complexo sistema são as glândulas paratireoides.
Eu sou o Dr. Erivelto Volpi, cirurgião de cabeça e pescoço especializado em doenças da tireoide e da paratireoide. Quando essas glândulas (que são incrivelmente pequenas) ficam doentes e produzem hormônio em excesso (condição conhecida como Hiperparatireoidismo), todo o equilíbrio do seu corpo é afetado.
A cirurgia é, na maioria dos casos, o tratamento definitivo para o hiperparatireoidismo. Neste guia completo, vou detalhar como diagnosticamos essa doença, os exames essenciais para localizar a glândula doente e a técnica cirúrgica que garante a cura.
O Que São e Como Funcionam as Glândulas Paratireoides?
Para entender a doença, é preciso conhecer a glândula. As paratireoides são quatro estruturas minúsculas, cada uma medindo apenas 6 a 8mm, que ficam localizadas atrás da glândula tireoide.
O Maestro do Cálcio: O Hormônio PTH
O trabalho dessas glândulas é produzir o Hormônio Paratireoidiano (PTH). O PTH garante que a quantidade de cálcio no sangue seja mantida em uma faixa estreita e ideal.
Quando o PTH está elevado, ele atua da seguinte forma, buscando elevar o cálcio sanguíneo:
- Nos Ossos: Retira o cálcio dos ossos, enfraquecendo-os (osteopenia ou osteoporose progressiva).
- Nos Rins: Diminui a eliminação de cálcio na urina.
- No Intestino: Aumenta a absorção de cálcio dos alimentos.
O Hiperparatireoidismo: Excesso de PTH e a Inversão do Equilíbrio
O hiperparatireoidismo primário ocorre quando uma (ou, em alguns casos, mais de uma) glândula paratireoide se torna hiperfuncionante, ou seja, cresce e produz PTH em excesso. O nódulo benigno que se forma na glândula doente é chamado de adenoma de paratireoide.
O excesso de PTH eleva o nível de cálcio no sangue (hipercalcemia), desencadeando uma série de sintomas e problemas de saúde.
Sinais de Alerta: Quando Suspeitar de Doença na Paratireoide?
O hiperparatireoidismo pode ser uma doença silenciosa, diagnosticada apenas por exames de sangue de rotina. Contudo, em casos mais avançados, ele pode se manifestar com sintomas que, por muito tempo, foram conhecidos como as "pedras, ossos, gemidos e queixumes" (em inglês, stones, bones, groans and psychic moans):
- Pedras: Formação de cálculos renais (pedras nos rins) de repetição, pois o excesso de cálcio no sangue é filtrado e depositado nos rins. Pode levar à alteração da função renal em estágios avançados.
- Ossos: Dor óssea, dor muscular, osteopenia e osteoporose progressiva, devido à retirada constante de cálcio do esqueleto.
- Gemidos e Queixumes (Sintomas Inespecíficos): Fadiga, fraqueza muscular, desânimo, depressão, e até mesmo úlceras gástricas.
Se você apresenta cálcio elevado no sangue e/ou cálculos renais de repetição sem causa aparente, é crucial investigar as paratireoides.
O Roteiro de Investigação: Dosando o Cálcio e o PTH
A investigação do hiperparatireoidismo primário é feita através de exames laboratoriais e exames de imagem, que nos ajudam a localizar o adenoma.
1. Diagnóstico Laboratorial (Confirmando a Doença)
A confirmação da doença se dá pela dosagem de duas substâncias no sangue:
- Cálcio Sanguíneo (e Urinário): O nível de cálcio sérico (no sangue) estará consistentemente elevado (hipercalcemia). A dosagem de cálcio urinário de 24 horas também pode ser utilizada.
- PTH (Paratormônio): O nível do PTH estará alto ou inadequadamente normal (não baixando em resposta ao cálcio elevado). O diagnóstico do hiperparatireoidismo primário é dado pela presença concomitante de cálcio elevado e PTH elevado ou inadequadamente normal.
2. Localização da Paratireoide Doente (O Desafio da Imagem)
Como as paratireoides normais são minúsculas, elas não são vistas em exames de rotina. Contudo, quando estão doentes (adenoma), elas crescem, tornando-se detectáveis. O desafio é que, mesmo aumentadas, a localização pode ser atípica ou difícil de precisar.
Para o planejamento cirúrgico, buscamos pelo menos dois exames de imagem que sejam coincidentes na localização da glândula doente:
- Ultrassom Especializado: Realizado por um médico com vasta experiência em tireoide e paratireoide. Embora desafiador, um ultrassom bem-feito pode identificar a paratireoide aumentada.
- Cintilografia com Sestamibi: Este é o exame que utiliza um marcador radioativo que é captado seletivamente pelas paratireoides hiperfuncionantes.
- SPECT-CT: Hoje, o padrão-ouro (Gold Standard) para a investigação é a Cintilografia associada à Tomografia (SPECT-CT). É um exame único que funde a imagem funcional (cintilografia, mostrando onde o marcador está sendo captado) com a imagem anatômica (tomografia, mostrando a posição exata), aumentando dramaticamente a precisão da localização.
Tomografia Computadorizada (Protocolo 4D) e Ressonância: Em casos mais desafiadores, especialmente em cirurgias de repetição, podemos recorrer a protocolos específicos de Tomografia (Protocolo 4D) ou Ressonância Magnética.
A Cirurgia de Paratireoide: Excisão do Adenoma
Uma vez confirmada a doença e localizada a glândula doente, a cirurgia é a opção terapêutica mais recomendada e curativa.
A cirurgia de paratireoide tem, na imensa maioria das vezes, uma recuperação rápida, com pouquíssimo tempo de internação e alta taxa de sucesso. Contudo, o sucesso cirúrgico depende de um elemento crucial que diferencia o procedimento: a dosagem de PTH em tempo real.
O Monitoramento do PTH Intraoperatório
A experiência do cirurgião é fundamental, mas ele não deve trabalhar às cegas. O uso da dosagem do Paratormônio (PTH) Intraoperatório é uma ferramenta que garante a certeza da cura antes do fim da cirurgia.
- O Protocolo: O médico colhe uma amostra de sangue no início do procedimento e outra após 10 a 15 minutos da remoção do adenoma suspeito.
- O Ponto de Corte: A cirurgia só é considerada curativa se houver uma queda significativa do PTH (geralmente uma queda de 50% ou mais em relação ao nível pré-remoção).
Lidando com Casos Desafiadores: Por Que o PTH Intraoperatório é Vital
Em cerca de $15\%$ dos pacientes, a doença pode envolver um segundo adenoma (doença multiglandular) que não apareceu nos exames de imagem iniciais.
- Cenário de Risco: O cirurgião remove o adenoma que foi visualizado na imagem, mas o PTH não cai no monitoramento intraoperatório.
- Ação Imediata: Se o PTH não cair, isso indica que há outro foco da doença (o segundo adenoma) ainda produzindo hormônio em excesso. Neste momento, o cirurgião deve suspender a alta e iniciar a busca pelas outras três glândulas paratireoides para encontrar o segundo foco e garantir que a cirurgia seja curativa.
Essa capacidade de confirmar a cura em tempo real torna a cirurgia moderna para hiperparatireoidismo extremamente eficaz, evitando que o paciente precise de uma segunda intervenção no futuro.
O diagnóstico de hiperparatireoidismo pode ser complexo, mas o tratamento cirúrgico é rápido, objetivo e, na maioria dos casos, curativo. O segredo está na investigação adequada (localização) e na execução técnica (monitoramento intraoperatório).
Se você foi diagnosticado, procure um especialista com experiência em toda a cadeia de tratamento, desde a interpretação dos exames de imagem específicos até a técnica cirúrgica com dosagem de PTH intraoperatória.
Aviso Legal: Este artigo foi escrito com o objetivo de educar e informar, apresentando a visão de um especialista na área. As informações contidas aqui são baseadas em diretrizes médicas e na experiência clínica do Dr. Erivelto Volpi, mas
não substituem em hipótese alguma a consulta médica presencial ou a avaliação especializada. A sua conduta de tratamento deve ser definida individualmente, após a análise completa do seu histórico, exame físico e exames complementares.
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